Um tema muito
polêmico levantado nos últimos dias refere-se a possibilidade de recondução ou
reeleição dos Presidentes da Câmara dos Deputados e do Senado Federal para um
novo mandato. Levada ao STF, essa discussão teve fim no último dia 06/12[1]
onde, pela maioria de 6 votos a 5, entendeu-se pela impossibilidade de
recondução dos atuais Presidentes no cargo, em observância ao disposto no art.
57, § 4º da Constituição Federal, declarando a reeleição inconstitucional.
De início, cumpre destacar o texto
constitucional em debate:
Art. 57. O
Congresso Nacional reunir-se-á, anualmente, na Capital Federal, de 2 de
fevereiro a 17 de julho e de 1º de agosto a 22 de dezembro.
(...)
§ 4º Cada uma das Casas reunir-se-á em
sessões preparatórias, a partir de 1º de fevereiro, no primeiro ano da
legislatura, para a posse de seus membros e eleição das respectivas Mesas, para
mandato de 2 (dois) anos, vedada a recondução para o mesmo cargo na eleição
imediatamente subsequente.
De fato, da leitura do texto legal
parece-nos difícil entender como seria possível uma interpretação que
permitisse a reeleição para os respectivos cargos, vez que o texto é expresso e
claro – é vedada a recondução (reeleição). Nesse ponto, importa frisar que sim,
é função principal do STF a interpretação do texto constitucional, atribuindo
sentido para aquilo que for obscuro ou definindo a abrangência de determinado
dispositivo; inegável, portanto, a importância da interpretação de toda e
qualquer lei em nosso sistema jurídico.
Existe uma razão básica para, no
Brasil e nos demais países que adotam o nosso sistema, haverem textos legais
previamente fixados: a segurança jurídica. Com efeito, é necessário que
possamos prever as consequências de nossos atos em todas as esferas: no Penal,
nos tributos, nos contratos, no previdenciário, etc., isso porque, para que a
sociedade funcione, pessoas e instituições não podem ficar à mercê de uma
decisão posterior do judiciário, da qual só saberão futuramente o conteúdo.
Afinal, não poderíamos imaginar uma sociedade na qual não saberíamos se nossos
atos levam ou não à prisão, sem saber quando e como podemos nos casar ou se a
compra de nossa casa ou carro é válida.
Nesse sentido, o direito como um
todo necessita, em síntese, ser estável, previsível, seguro e confiável, pois
sua finalidade é guiar a sociedade dentro daquilo que ela mesma entendeu como
sendo o correto.
Tudo isso nos devolve à discussão inicial
em que todo o texto legal necessita uma interpretação, e esta é de competência
do judiciário. Existem diversas maneiras de interpretar um texto: restringindo
ou ampliando seu sentido, atribuindo o seu contexto histórico, identificando a
finalidade do legislador ao criar a lei, entre outros. Contudo, a atividade do
judiciário sempre será limitada ao texto da lei, sob pena de este Poder invadir
a esfera do Legislativo e atuar como legislador ativo, o que é absolutamente
vedado em nosso sistema jurídico.
Nessa senda, parece-nos claro que
fere a segurança jurídica, tão fundamental para o direito, extrair de um texto
onde consta: “é vedada a recondução (reeleição)”, uma interpretação nesse
sentido: “é permitida a recondução”. Se permitirmos tal ato, entraremos em um
terreno perigoso e que pode vir a ser muito prejudicial ao direito e à
sociedade como um todo.
Por fim, ainda que seria importante
aprofundar no tema da interpretação legal e na argumentação utilizada pelos
ministros na decisão mencionada, isto acaba sendo um tema para outro momento. O
que busquei enfatizar aqui foi ressaltar um lado, o do respeito ao texto legal
puro e, especialmente, as razões em virtude das quais devemos observá-lo.
Igor Marcelo Blume
15/12/2020
[1]
CONJUR. STF confirma que recondução na Câmara
e no Senado é inconstitucional. Disponível em: <https://www.conjur.com.br/2020-dez-07/stf-decide-reeleicao-camara-senado-inconstitucional>.
Acesso em: 14/12/2020. [online].